Os meus três personagens
Desde que nasci dei conta que ainda sou eu, pergunta tão óbvia, se isso não fosse loucura, então o que seria, como é que a loucura se manifesta se quando o normal é o louco e o louco já é o anormal, se neste estado que me encontro não fosse sufoco, o que é que o sufoco tem haver comigo? Pois me apelidaram de Kaló, além do nome Kaló tenho vários “outros” deles dentro de mim. Por agora só vou falar de três.
Primeira personagem
Por exemplo. Um dos indivíduos que habita dentro de mim, passa vida na praça a ler livros e jornais, criaturas que deambulam na praça acham estranho um louco lendo livros e jornais roubados da Biblioteca Municipal, pois, para não entenderem prefiro induzi-los, cada vez mais, naquela escuridão visual e mental, uso uma linguagem para poderem me julgar, já que é o louco que esta lendo, então, ai entra uma grande ideia de ler usando uma outra linguagem, de ler o livro de Frantz Fannon, cada vez que pessoas ficam tentando entender o que digo uso uma outra linguagem, uso a língua africana, já que não dão a mínima para a África uso uma de suas línguas que gosto muito, a língua dos iorubas. Onde que aprendi? no youtube, estranhou? São palavras quase idênticas.
O que gosto muito de dizer é, ti emi babá alaisan normal faz isso? o que é que isso significa? Meu grande pai gente normal faz isso? Já que me apreciam como louco, que aceito, eu sou louco e eles são normais mas insanos, esta personagem não para por aqui, esta personagem que sou eu, já leu e gosta de ler história mundial, a história mundial está cheio de pessoas como eu. Por exemplo li sobre um gajo que queria exterminar com a rasa Judeia para superiorizar a sua raça no mundo, achei isso fantástico e fascinante porque ele foi idolatrado e ainda faz parte da história, como o mundo estava e ainda esta cheio de pessoas como eu, ou seja louco feito Kaló .
Esta mesma personagem que também é Kaló passa tempo na praça lendo sobre as guerras no mundo e conclui que a minha loucura é um grão de arreia em relação a milhões de mortes que os líderes políticos provocaram em nome da ganância e imbecilidade, mais ainda, só não choro porque somos iguais, ou seja louco. Não vou citar mais exemplos porque não quero magoar os meus colegas de profissão da demência, a única diferença que tem entre eles e eu é que eu sou louco rotulado e caído na minha própria desgraça, mas sem graça é que aqueles normais que tinha referido antes são pagos para serem loucos e quando isso é assim fica sem graça. Ou competimos na igualdade da demência ou então assumem de uma só vez que a humanidade em especial os psicanalistas e psicólogos erraram na atribuição de menu para cada sintoma no seu verdadeiro ramo de acção e reacção já que a contra reacção esta completamente ao contrario, porque se é assim eu me declaro normal, alias normalíssimo.
Minha personagem dois.
Esta personagem anda pela vila arrumando caixas que abarrotam contentores e nessas caixas coloco, recipientes de vidro, de plásticos, e assim deixo mais espaço nos contentores e coloco esses lixos em algum terreno baldio, mas estranho é que não repararam até ainda que devem separar os objectos de vidro e de plástico quando vão deitar o lixo no contentor, mas pronto, talvez ainda não se aperceberam pelo fato de quem esta dando esses sinais ser um louco. Mas se eu disser que não sou louco? seja qual for a resposta deles responderei sempre - que tenho intimidade com a loucura mas que não sou louco. De certeza irão dizer que estava fingindo de louco, é claro que enquanto no estado da loucura fiz coisas erradas, mas pergunto. - que ser normal que ainda não fez algo errado? Pelo menos o que eu faço é evidente e esperado, mas não sou eu quem faz essas coisas, quem faz essas coisas é uma das minhas pessoas que vive dentro de mim. Por exemplo, nesta personagem, este que chamo de louco, mora em todos nós, só que o meu está mais presente, porque é assim que me sinto conectado com o mundo é assim que consigo ver coisas que os normais não conseguem ver. Nesta personagem fumo uma ganza, e me sinto bem, todos sabem que rolo uma ganza. Mal esta a fazer alguns dos meus manos que vejo fumando e me passam a ganza para fumar, acho isso normal porque eu não pago imposto não pago conta, e a minha vida não tem nada a ver com ninguém, sou eu e os meus personagens. Por exemplo vou a Biblioteca Municipal de Tarrafal vejo e revejo, reparo uma gritante falta de livros que tinham ali, mas ainda tem alguns bons livros, frequentei e ainda frequento a biblioteca mais do que os vereadores de cultura que já passaram pelo Tarrafal, junto com todos os presidentes de câmara que já passaram por este município, incluindo os deputados, alias eu sou o maior frequentador das bibliotecas do mundo, já que o único louco que tem direito de estar livre e de livro nas mãos para ler sou eu, duvido que haja loucos com esses benesses dentro de uma sociedade, apesar de que aqui todos nos somos loucos só eu é que já dei conta, e os restantes 18 mil e tal habitantes desta cidade permaneceram no estado de fingimento de normalidade quase anormalidade. Agora queria que o meu irmão entendesse o porquê que nunca gostei de ir para América, eu sou o Nabucodonosor de Tarrafal sem titulo e sem nobreza, mas rei da loucura. Continuando na biblioteca digo que tem lá um chefinho até em dimensão da sua altura as vezes ele me da medo mas o meu estado de loucura põe lhe com pena de mim, como são fracos os humanos, mas não são eles que estão mal. Mal está a população estudantil que frequenta aquele espaço para estudarem o barulho, sim o barulho, o barulho agora é moda, é barulho a musica, que sai da Net, iphone, ipad, portátil não entendem que tudo isso fedi a inteligência, em vez de aprenderem a reclamar e exigirem de melhores condições de estudo nas bibliotecas, ficam a reclamando dos namorados tapados e otários que pofam como eu. Olhando isso não aguento o meu estado da loucura entra no quintal da biblioteca apanha água no pote, lança no chão, roubo os livros e saio a correr e volto a ter mais de três messes sem colocar os pés na biblioteca.
Terceira personagem
Assim guardo o louco e coloco o bobo.
É aquele que faz careta para a minha mãe rir de mim, e tento agrada-la só para não ouvir da boca dela a palavra louco. Quando é assim a nossa casa é a corte e eu sou o bobo, a minha mãe fala inglês e eu conto até três, tudo em inglês é tudo o que eu sei em inglês. Por três vezes ela também tentou me levar para América, por três vezes recusei, agora tenho essas três personagens dentro de mim que descobri. Quando ela não está presente no país ficamos dentro de casa por dois a três messes enquanto ela passa as férias na terra das três letras, E.U.A. Fico aqui perguntando - O que é a vida? Sem estar louco, pelo menos tenho essas três personagens que me fazem sentir ser o verdadeiro Kaló , e pergunto a você, se já procuraste as tuas três personagens, ou seja louco. Pelo menos os loucos falam pouco, é que somos essa raça, os dementes.
Texto meramente ficcional.
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